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quinta-feira, 7 de abril de 2016

Delator cita no Conselho repasse de US$ 5,1 milhões que seria para Cunha

Leonardo Meirelles é ex-sócio do doleiro Alberto Youssef.
Segundo ele, doleiro disse em almoço que dinheiro seria para Cunha.

Fernanda Calgaro
Do G1, em Brasília

Em depoimento ao Conselho de Ética da Câmara nesta quinta-feira (7), o empresário Leonardo Meirelles disse ter comprovantes de depósitos bancários, totalizando US$ 5,1 milhões, de valores que recebeu em suas contas no exterior e que teriam como destinatário final o presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Meirelles afirmou que transformou esse dinheiro em reais e o entregou em espécie ao doleiro Alberto Youssef, que depois informou a ele que seria destinado para o parlamentar.

  Meirelles disse aos deputados do colegiado não ter feito nenhum depósito diretamente em contas de Cunha e relatou não saber se ele tem ou não conta no exterior.

Procurada, a assessoria do presidente da Câmara disse que ele não vai se manifestar sobre o assunto. O advogado que o representa no conselho, Marcelo Nobre, deverá falar com a imprensa após a sessão do colegiado.


Delator na Operação Lava Jato, Meirelles é ex-sócio de Youssef e cedia empresas para que o doleiro fizesse repasses de recurso ao exterior que seriam destinados depois a supostos beneficiários de propina.

Cunha é investigado no Conselho de Ética pela suspeita de manter contas bancárias secretas no exterior e de ter mentido sobre a existência delas em depoimento à CPI da Petrobras e de não as ter declarado no Imposto de Renda. O presidente da Câmara nega ter conta, mas apenas o usufruto de fundos geridos por trustes.

Meirelles contou, porém, que, a pedido de Youssef, recebeu três transferências em 2012 de uma empresa do empresário Júlio Camargo, totalizando US$ 5,1 milhões, na conta de uma empresa sua, chamada RFY, na China. Ele relatou que transformou esse dinheiro em reais e o entregou em espécie a espécie a Youssef.

Em uma das vezes, havia um entregador aguardando para pegar o dinheiro com Youssef e levá-lo para um condomínio na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro. Segundo Meirelles, esse emissário era o agente afastado da Polícia Federal Jayme Alves de Oliveira Filho, conhecido como Jayme Careca. A residência de Cunha no Rio fica em um condomínio na Barra.


  Na ocasião, Meirelles disse que não sabia o destinatário do dinheiro, mas que, dias depois, em um almoço informal, Youssef disse que os US$ 5,1 milhões seriam destinados a Cunha. Relatou ainda que, quando teve conhecimento das delações do próprio Youssef e do Júlio Camargo, associou as acusações feitas por eles contra Cunha com as operações que tinha feito.

"Uma semana após a operação, almoçando com o Alberto, nesse mesmo dia eu vi o Júlio [Camargo] saindo do escritório do Alberto, fomos almoçar e ele me disse: 'Você nem imagina a pressão que eu estava sofrendo'. E disse que era do investigado [no Conselho de Ética], que era de Eduardo Cunha", afirmou.

Segundo Meirelles, após virem à tona as delações do Júlio Camargo e de Youssef, que mencionavam esse pagamento de propina a Cunha, ele pediu autorização ao juiz Sérgio Moro, responsável pela Operação Lava Jato na primeira instância, para buscar extratos na China das transações bancárias e que toda a documentação foi entregue à Procuradoria.


De acordo com a investigação dos procuradores, os recursos dizem respeito a propina recebida por Cunha em contratos da Petrobras de dois navios-sondas da empresa coreana Samsung Heavy Industries Co. e da japonesa Mitsui.

Meirelles confirmou aos deputados que sabia que os US$ 5 milhões que seriam destinados a Cunha estavam relacionados ao esquema de corrupção da Petrobras. Segundo ele, os repasses que eram feitos para suas contas vinham de empresas que prestavam serviço a empreiteiras ligadas à estatal.

"Sim, [sabia]. As operações das empresas de fachada de Youssef eram com empresas que prestavam serviços à Petrobras", disse, acrescentando que recebia 1% do valor bruto de todas essas transações. Ele informou ao conselho ter movimentado US$ 140 milhões durante quatro anos em que operou para Youssef

Defesa de Cunha


Após a sessão, o advogado Marcelo Nobre, que faz a defesa de Cunha, disse que seria um “absurdo” se o conselho considerasse o depoimento de Meirelles como prova. “Ele não trouxe um documento. Ele disse que um terceiro, numa conversa informal, disse a ele que era o meu cliente [o destinatário dos recursos]. Como é que se condena alguém desse jeito?”, indagou.


Nobre reiterou que o Conselho de Ética investiga exclusivamente se Cunha mantém contas secretas no exterior e que não poderá avançar além disso. “Não existe isso no direito. A defesa se defende da imputação. É como uma denúncia do Ministério Público sobre um fato. Se, no curso do processo se descobre qualquer outra coisa, o Ministério Público investiga e faz uma nova denúncia. Nunca no mesmo processo, isso é ilegal, é contra a lei”, afirmou.

A defesa de Cunha havia chegado a acionar o Supremo Tribunal Federal (STF) para cancelar o depoimento de Meirelles e de todas as outras sete testemunhas da acusação arroladas pelo relator, Marcos Rogério (DEM-RO), sob a alegação de que nada teriam a esclarecer sobre o objeto do processo no conselho. No entanto, a ministra Cármen Lúcia negou o pedido, liberando, assim, as oitivas.

Normalmente, é praxe que a Câmara banque com os custos do transporte de depoentes, mas o pedido feito pelo colegiado não obteve resposta da Mesa Diretora, presidida por Cunha. Diante disso, o próprio Meirelles arcou com as despesas da passagem aérea de São Paulo a Brasília para que pudesse comparecer ao conselho.


O presidente do colegiado, José Carlos Araújo (PR-BA), criticou o comando da Casa e disse que o conselho iria agora pleitear agora o ressarcimento. O relator também acusou o presidente da Câmara de mais uma vez tentar atrapalhar o andamento. “É, claramente, uma tentativa de obstrução dos trabalhos”, afirmou.

Houve bate-boca entre deputados aliados do presidente da Câmara e adversários dele para que o depoente assinasse um termo de compromisso atestando que dirá somente a verdade. Como a presença dele no conselho é como testemunha, o advogado dele, Haroldo Nater, de início não quis que ele assinasse o documento, mas, diante do protesto de aliados de Cunha, acabou cedendo.

Durante o depoimento, aliados de Cunha acusaram Meirelles de "pirotecnia" e de querer encenar um "teatro" ao não trazer provas concretas de que Cunha teria contas no exterior. "O processo aqui é sobre a existência ou não de contas secretas", reagiu o deputado Carlos Marun (PMDB-MS), um dos defensores de Cunha.

O deputado Chico Alencar (PSOL-RJ) rebateu: "O que ele trouxe aqui é extremamente valioso", ponderou.

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