"Ser chamado de brega é horrível", desabafa Odair José, 65, um dos
artistas mais populares do Brasil.
"Tenho a esperança de que as pessoas
vão entender a qualidade do meu trabalho antes de eu morrer", diz à Folha, de um hotel em Fortaleza, QG dos shows da turnê nordestina.
Mais da metade do repertório atual desse goiano que chegou a ser chamado
de "O Terror das Empregadas" é composta por músicas dos álbuns dos anos
1970: "Assim Sou Eu..." (1972), "Odair José" (1973), "Lembranças"
(1974) e "Odair" (1975). Tudo isso será relançado neste mês na caixa de
CDs remasterizados da série "Tons".
Este é um novo capítulo de reavaliação da obra de Odair, novela de
roteiro nada linear. Um episódio de revisão aconteceu em 2006, no CD
"Vou Tirar Você Desse Lugar", tributo a Odair gravado por artistas da
cena pop.
| Jarbas Oliveira/Folhapress | ||
| O cantor Odair José posa em frente a hotel em Fortaleza |
Outro ocorreu em 2011, no CD "Praça Tiradentes", em que ele mesmo
resgatava "o velho Odair", instigado por Zeca Baleiro (e com sua
participação). "Odair inaugurou um jeito de fazer música brasileira",
afirma Zeca.
"Ele construiu uma obra com temas populares como eram o rock, o country e
o blues no começo, e foi corajoso, dando a cara a tapa para que, 20 e
tantos anos depois, garotos do Leblon e Ipanema como Cazuza e Lobão
pudessem brincar de bandidos", diz o músico.
Hitmaker incontestável, Odair está na formação de vários músicos das
novas gerações, como Fred Zero Quatro, do Mundo Livre S/A.: "Cresci no
interior ouvindo rádio. Os sons românticos dele estavam entre meus
preferidos".
Odair José conta que é inconformado com a percepção errônea sobre seu trabalho.
Em 1972, depois de estourar com "Vou Tirar Você Desse Lugar", lançado
pela CBS, ele descobriu o folk rock de Neil Young, Cat Stevens e Ritchie
Havens, e se empenhou em sair do gênero no qual foi inserido, a Jovem
Guarda.
| Editoria de Arte/Folhapress |
A sonoridade recorrente da gravadora, a mesma de Roberto Carlos, não lhe
agradava. "Todos os discos tinham o som do órgão e das guitarras de
Roberto", afirma.
Incentivado por amigos como Raul Seixas, Odair resolveu mudar o som e
fazer letras que fossem como reportagens de jornal. A CBS não gostou e
ele assinou contrato com a Polydor, "em busca de autonomia".
Lá montou banda com José Roberto Bertrami (piano), Alex Malheiros
(baixo) mais Ivan "Mamão" Conti (bateria), que depois formariam o
Azymuth; o soulman Hyldon (guitarras) e ainda Luiz Cláudio Ramos
(violões), futuro maestro de Chico Buarque.
A safra de discos entre 1972 e 1975 evidencia a qualidade dos músicos e a
intenção roqueira de Odair José, que difere de outros ícones românticos
tidos como "bregas".
Para John, do grupo Pato Fu, Odair faz "música pop das mais genuínas,
misturando influências estrangeiras com uma prosódia brasileira". O
músico também destaca "a desconcertante franqueza nas letras".
Os quatro álbuns da série "Tons" venderam bem naquela década. E o autor
dos hits radiofônicos como "Uma Vida Só (Pare de Tomar a Pílula)",
canção que chegou a ser censurada pelo governo, extrapolou as
expectativas: foi incluído na lista de artistas que assinaram contrato
de exclusividade com a Globo para combater a saída de Chacrinha da
emissora. Roberto Carlos era outro artista dos "top five".
O sucesso teve um revés na segunda metade dos anos 1970, quando saiu o
álbum conceitual "O Filho de José e Maria", influenciado pela guitarra
do britânico Peter Frampton e a leitura de "O Profeta", de Khalil
Gibran.
Odair se desiludiu com a receptividade. "Ninguém entendeu nada, aí acabei descuidando da carreira."
Foi nesse período, diz, que passou a consumir maconha e cocaína. "Caí
tanto na boêmia que, se não fosse a Jane [com quem casou nos anos 1980],
teria morrido."
Hoje, ele se diz mais "focado" e feliz quando está no palco. Seria bom
se fosse inserido num contexto pop rock, ao lado de Lulu Santos ou Kid
Abelha. Se nunca mais fosse chamado de "brega", seria perfeito.
QUATRO TONS - ODAIR JOSÉ (CAIXA COM 4 CDs)
QUANDO outubro
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