A
Ambev, empresa que mais e melhor investe no futebol brasileiro, às
vezes peca pela euforia. No caso da Copa, exagera quando decide, com
campanha publicitária na TV e tudo mais, que o evento será um grande
sucesso. “Imagina a festa!”. No “Movimento por um Futebol Melhor”,
exagera quando sugere que brasileiros irão tirar Messi do Barcelona
porque terão mais sócios-torcedores.
No encontro entre executivos e jornalistas feito em São Paulo nesta terça-feira (21/05), a Ambev anunciou a ampliação do projeto
– em resumo, sócios ganham descontos em produtos, clubes ganham por ter
mais associados, e empresas ganham em vendas e imagem por apoiar o
futebol.
A cervejaria, em vários momentos da coletiva de imprensa, abusou do velho e conhecido “e se?”.
A Ambev propõe pensar em dois cenários. O primeiro: e se todos os
times tivessem o mesmo sucesso que o Internacional? E se, em uma
hipótese ainda mais otimista, todos fossem o Benfica?
O Benfica tem, proporcionalmente, o maior quadro social do mundo. De
toda a torcida, o time português conseguiu converter 4% em
sócios-torcedores. No Brasil, quem tem o melhor aproveitamento neste
aspecto é o Internacional de Porto Alegre, com 1,73% do total.
Começa aí um exercício de imaginação.
O
Flamengo, dono da maior torcida do Brasil, tem um dos índices mais
baixos. Só 0,06% é sócio. O Corinthians tem 0,20%. Todos os demais
principais clubes do Brasil não têm mais do que 1%.
Nas contas da Ambev, o Flamengo poderia chegar a um faturamento de R$
764 milhões se conseguisse o mesmo percentual que o Benfica. Ou R$ 330
milhões, se alcançasse o Internacional.
A
matemática está correta, mas a projeção é pouquíssimo realista. Não que
seja um absurdo pensar que a gestão dos clubes brasileiros possa ser
tão ou mais eficiente que a do Benfica. Não é.
Mas sonhar com R$ 764 milhões apenas com sócios tem tanto efeito
prático quanto planejar o que fazer com um prêmio de US$ 590,5 milhões, aquele que o americano ganhou na loteria. Nenhum.
Não há, no mundo, equipes de primeira linha que ganhem mais com
sócios do que com TV e patrocínios, por exemplo. Mesmo o Benfica,
referência no assunto para a Ambev, não tira tanto dinheiro do quadro
social como tira de emissoras e empresas. Em 2011/2012, foram € 17
milhões em publicidade e patrocínios, € 8,4 milhões com televisão e
€ 8,3 milhões de associados.
No Brasil, em 2012, o Internacional ganhou R$ 89 milhões com direitos
de transmissão, R$ 25 milhões com patrocínios e R$ 45 milhões com
sócios. Para que os gaúchos cheguem ao percentual do Benfica, 4%, eles
teriam de dobrar a receita que têm com o quadro social.
Ainda
em 2011, motivado pelo bom desempenho na área, o marketing do Inter
lançou campanha para chegar aos 200 mil associados. “Se cada sócio
trouxer mais um sócio”, dizia o clube, a meta seria batida. Como se vê
no “torcedômetro” montado pela Ambev, a referência brasileira na área ainda precisa chegar aos 100 mil – por enquanto, são 82,9 mil.
Perguntei a Marcel Marcondes, diretor de negócios no esporte da
cervejaria, se os números divulgados no encontro desta terça foram
calculados mais para impressionar do que para confiar. “São factíveis”,
respondeu. Mas o desejo da Ambev é bem mais realista: 1 milhão de sócios
até o fim de 2013, na soma de todos os clubes participantes, e 3
milhões até 2015.
O mau de pensar em números tão extravagantes é que, ao tirar os pés
do chão, perde-se um pouco do bom senso. Abre espaço para que apareçam
comentários bobos sobre trazer Xavi, Iniesta e Messi, do Barcelona, para
jogar no Brasil com o dinheiro que os clubes ganharão com associados.
Coisa que o público adora.
Tão divertido – e tão ingênuo – quanto pensar em quantos sonhos
realizados você teria, quantas pessoas você ajudaria, se ganhasse US$
590,5 milhões na loteria americana. E se?
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